Como ser um poeta do silêncio
e escrever com o vazio?
Na arte, a escrita logo foge
pra mata do sentimento,
onde não há trilhas asfaltadas
de compreensão.
Ela parte do deserto,
mas se abriga na selva
densa, cerrada,
é palavra-curupira
com seus pés contrários,
palavra-saci caminhando aos saltos,
palavra-iara
submersa na água clara.
Procurá-la do alto
é não achar, na certa.
Vá pro chão explorar,
desbravar a terra
– não como bandeirante,
mas suave como um caboclo,
sagaz e simples como um mateiro.
A palavra exala úmida e fresca,
seu cheiro é forte e gostoso,
não a comeremos,
saberemos a sua presença
sem a tocar
e, com o tempo,
pode ser
que chova em nós.