Na ladeira de pedras centenárias
banhada do suor de mil escravos,
em meio ao casario sóbrio
de paredes encardidas por um pó
antigo como o tempo,
está a casa da avó.
Em Minas, as famílias se encrustam
por gerações e gerações,
são a riqueza maior da gente
humilde e digna,
delicadeza bruta
que só o mineiro tem.
A avó está na sala, sentada,
apoiada na bengala de madeira escura,
junto aos móveis austeros
e à prataria enegrecida.
E lá fora a cidade peleja calma
no andor de quem palmilha
vagamente estradas pedregosas.
Lá fora, a cidade vela a casa da avó,
as senhorinhas nas janelas,
a torre da matriz,
a revoada dos pássaros,
os homens de chapéu.
Lá fora há um vazio
promissor de coisas,
de bênçãos, por certo
– afinal, estamos em Minas.
Lá fora, há um mundo vasto,
de mistério,
invisível aos nossos olhos,
que param nas montanhas de minério.
Lá fora, a avó tem a salvaguarda
de Carlos e Adélias.
Lá fora é Minas
e Minas, no fundo, também é a casa da avó.